"Não nos teríamos apercebido de muitas ideias nossas, se não tivéssemos conversado com os outros."
(Noel Clarasó)


domingo, 11 de dezembro de 2011

Trabalho de grupo

Grupo VIII

Enunciado: O Governo decidiu proceder a um aumento das propinas do Ensino Universitário Público, acima do nível da taxa de inflação previsto para 2011. Inconformado, Abel decide interpor uma acção no Tribunal Constitucional, alegando que tal medida viola o seu direito à educação e o seu direito ao desenvolvimento da personalidade. Por seu turno, Bernardina endereçou uma queixa ao Provedor de Justiça, alegando o mesmo que Abel. Face à contestação estudantil, o Governo respondeu que a medida não é inconstitucional, pois não existe qualquer garantia contra o aumento indiscriminado do preço das propinas.
Analise as acções e alegações dos vários intervenientes, indicando se têm ou não razão.

Resposta
De acordo com o artigo 277.º, n.º1 da CRP, são inconstitucionais as normas que venham infringir o disposto na Constituição ou os princípios nela consagrados. Veremos, adiante, se o caso apresentado é ou não inconstitucional por violação de alguma das normas enquadradas no âmbito dos direitos consagrados na Constituição.
Da legitimidade dos Autores:
Vamos para já discutir a legitimidade dos autores – Abel e Bernardina, em apresentar respectivamente ao Tribunal Constitucional e ao Provedor de Justiça, uma acção por violação de um direito constitucional.
Pela leitura do Título I da Parte IV da CRP, que se refere à fiscalização da constitucionalidade, e muito especialmente pela letra do n.º 2 do art.º 281 da CRP, que vem dizer-nos quem tem legitimidade para requerer ao TC a declaração de inconstitucionalidade da norma no âmbito da fiscalização abstracta da constitucionalidade, deduzimos que:
- a acção interposta por Abel não poderá prosseguir, já que este não tem legitimidade para interpor uma acção no TC, no contexto indicado no caso concreto (vide alíneas a) a g) do n.º2 do art.º 281 da CRP);

- a queixa apresentada por Bernardina poderá ser aceite, já que, de acordo com a alínea d) do n.º2 do art.º 281º, é o Provedor de Justiça quem tem legitimidade para suscitar junto do Tribunal Constitucional a fiscalização abstracta sucessiva da constitucionalidade de normas jurídicas atendendo a que lhe cabe, através de meios informais, defender os direitos, liberdades, garantias e interesses legítimos do cidadão, assegurando a legalidade e a justiça da actuação dos poderes públicos.

Referimos a fiscalização abstracta por logo à partida termos excluído a aplicação dos artigos 278 (fiscalização preventiva) e 280 (fiscalização concreta) da CRP - liminarmente excluídos do âmbito do caso em análise por não estarem preenchidos os requisitos formais e substanciais destes artigos.
Acresce o facto de o caso em concreto preencher o disposto no art.º 281, já que se pretende uma declaração pelo TC da violação de direitos constitucionais e não uma pronuncia que entre no âmbito do art.º 278 ou um recurso que se enquadre na letra do art.º 280.

Das alegações dos intervenientes
Abel e Bernardina:
O artigo 73.º, n.º 1, consagra que todos «têm direito à educação e à cultura», competindo ao Estado promover «a democratização da educação e as demais condições para que a educação, realizada através da escola e de outros meios formativos, contribua para a igualdade de oportunidades, a superação de desigualdades económicas, sociais e culturais, o desenvolvimento da personalidade (...), para o progresso e para a participação democrática na vida colectiva (artigo 73.º, n.º2).
Ora este artigo, que se enquadra nos “Direitos e deveres culturais” constitui um direito social, um direito que vem contribuir para a igualdade de oportunidades e para a superação das desigualdades económicas, sociais e culturais (art.º73 n.º2, 2ª parte) e onde se recorta o desenvolvimento da personalidade como um dos fins da promoção da educação e cultura.
Trata-se pois de um direito garantido pelo Estado, ao criar por exemplo, as universidades e ao permitir o acesso em iguais circunstâncias, a todos os interessados no desenvolvimento da personalidade na vertente da educação e cultura.
Neste contexto, mais do que a aplicação do direito à educação (artigo 73º, n.º 1 e 2), parece-nos de fulcral importância que a questão seja elucidada à luz do disposto no artigo 74º da CRP, que se refere ao Direito ao ensino.
Assim, A e B. deveriam ter sido trazido à colação o artigo 74.º, n.º 1, que consagra que todos «têm direito ao ensino com garantia do direito à igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar», cumprindo ao Estado garantir «a todos os cidadãos, segundo as suas capacidades, o acesso aos graus mais elevados do ensino, da investigação científica e da criação artística» [alínea d)], e estabelecer «progressivamente a gratuitidade de todos os graus de ensino» [alínea e)].
Da alínea d) e e) do n.º2 do artigo 74º, resulta uma obrigação pública do Estado garantir a todos o acesso ao ensino mediante a abolição e a superação de obstáculos baseados em motivos de carências sociais ou económicas, já que o direito ao ensino, enquanto direito positivo, implica um conjunto alargado de obrigações a implementar pelo legislador.
Não obstante, acompanhamos a posição do Prof. Gomes Canotilho que defende que se trata de uma “(...) imposição constitucional permanente, de realização progressiva, de acordo com as disponibilidades públicas”, nomeadamente no que se refere à gratuitidade do ensino.
Com efeito, havendo recursos limitados, e principalmente no quadro da conjuntura económica em que nos encontramos, há que estabelecer prioridades que devem, precisamente devido à limitação de recursos, privilegiar os que não possam suportar os custos económicos e financeiros do ensino superior. Assim, desde que haja uma “concordância prática” entre uma actualização do valor das propinas e a ampliação do sistema social de isenção de propinas e de bolsas de estudo, não nos parece que a decisão do Governo seja desconforme com a Constituição.
Acresce que, em nosso entender, e salvo melhor opinião, ao optar pelo aumento e actualização das propinas, o legislador não veio subverter o conteúdo mínimo da imposição constitucional (ainda que o caso em análise não nos refira em quanto foram aumentadas as propinas, quer-nos parecer que o valor não será desproporcional ao ponto de criar graves situações de aumento no pagamento das mesmas).
Desde que se garanta um mínimo de certeza nos direitos e nas expectativas juridicamente tuteladas dos cidadãos e principalmente, desde que os alunos não sejam afectados de forma inadmissível e arbitrária nos direitos e expectativas legitimamente fundados, não poderemos concordar com a ideia de inconstitucionalidade da norma.
Por um aumento superior à taxa de inflação, não nos quer parecer que fiquemos perante uma situação na qual o ingresso e a frequência das instituições do ensino superior público fiquem inevitavelmente comprometidos, prejudicando o disposto no artigo 73º e 74º da CRP.
Num quadro constitucional como o português (e atendendo aos princípios que atrás se apontaram), a exigência do pagamento de propinas aos alunos que as podem pagar só seria inconstitucional se estas fossem, conforme já aludimos, de montante tal que daí resultasse a subversão da incumbência constitucional de o acesso ao ensino superior garantir a igualdade de oportunidades e a democratização do ensino.

Neste quadro, pensamos que é de apoiar a resposta adiantada pelo Governo, na medida em que não consideramos ser inconstitucional o aumento das propinas do Ensino Universitário Público acima do nível da taxa de inflação previsto para 2011 e não acompanhamos os argumentos apresentados por Abel e Bernardina.

Grupo de trabalho:

Carla Silva N.º131209031
Inês Rodrigues N.º 131209023
Liliana Kaidussis

Sem comentários:

Enviar um comentário